segunda-feira, 19 de outubro de 2020

Parar um certo Futuro

 



Pronto! Chegou a hora de parar o Futuro (que exagero de expressão!...). Quero dizer, parar de ler, ver, ouvir, etc, o que se vier a produzir, abrindo obviamente excepção apenas para o excepcional. Porque o tempo de viver em vida é cada vez mais escasso e há que voltar ao que nos deu prazer, reler clássicos por exemplo, devorar as cores que Turner nos deixou, por exemplo...


Umberto Boccioni, A rua entra em casa

WW III


 A minha teoria de conspiração diz-me que estamos em plena 3ª Guerra Mundial Desde o reforço bélico russo à retirada de tropas americanas dos cenários quentes, passando por uma China silenciosa e silenciadora, E o factor despoletador, esta pandemia que mata pouco mas confina muito, num teatro encenado a partir da tal China, e com o texto decorado pelos países ocidentais em quase uníssono. Um texto que nos amarra, nos transforma em causadores do alastrar da pandemia, e por isso nos retira as liberdades e aniquila negócios. Tudo neste cenário benzido pelas instâncias de poder, pelas instituições de saúde, tudo construído de forma a que os colapsos pessoais e colectivos se sucedam até que todo o baralho que era o nosso castelo de cartas, se desmorone aos pés das potências economicamente conquistadoras.

Quatro cavaleiros do apocalipse

segunda-feira, 28 de setembro de 2020

Fim de mais um mundo


 

À medida que vamos esgotando a nossa vida, vamos concluindo que o mundo que conhecemos vai acabando. É só esta a razão pela qual assistimos a diversas gerações dizerem que estão a presenciar o fim do mundo. Esquecem-se de sublinhar, em voz titubeante, que novos mundos, ou mundos renovados, se estão a formar.

É tão só isto, o fim do mundo.

terça-feira, 8 de setembro de 2020

O impossível possível

 


Abismado, fiquei a saber que John Cage compôs uma peça que está em execução desde 2001 - o compositor morreu em 1992, escapando à sua própria maldição - e que terminará em 2640. Aqui, sem gralhas, decide-se que a música não é para fruição mas para função. Assim, viro-lhe as costas. 

Numa igreja medieval em Halberstadt, no sábado passado, uma "audiência" escutou uma mudança na sonoridade na composição para orgão, a 14ª desde 2001. Isento-me de comentar sobre aspectos práticos, ou quaisquer outros, desta composição que demora 640 anos a se executada. Executem-na!

Brueghel, Tower of Babel

terça-feira, 19 de maio de 2020

Saudades de liberdade


Saudades de liberdade. Da liberdade de poder ser só eu. De uma liberdade cada vez mais utópica. Sem o rastreio alheio de quem não nos interessa, Com as limitações assentidas e consentidas de quem nos interessa. Rejeitando a depressão dos desconfinamentos confinados. Em nome do prazer de viver contra a ditadura que nos proíbe de ter prazer.
Saudades dos passeios descontraídos no Upper East Side, com intervalo para saborear as madalenas que Dominique nos faz chegar naqueles sacos de pano, quentinhas, tão leves que comer apenas duas nos envolve em remorsos. Remorsos que nos perseguem Village adentro, mas que se dissipam com a descoberta das montras avant-garde, que a mim só despertam curiosidade e não a luxúria de comprar,,,
Saudades dos passeios em Montmartre, escadaria acima escadaria abaixo...
Saudades dos canais venezianos que nos embalam como ninguém, rumo a uma igreja onde nos espera Tintoretto, ou talvez apenas Ticciano...
Saudades do Sussex, de Arundel, de Rye, e de algum Glyndebourne...
Saudades da Colina Verde, e até, porque não, dos experimentalismos bacocos que pretendem transformar Bayreuth, no farol da modernidade wagneriana.
Saudades do silêncio do Douro...
Saudade de... saudades de...
Hoje, estou triste porque só tenho saudades. Porque as saudades chegam-me quando receio que o seu objecto se vá afastando do meu alcance.

Seurat, une baignade

terça-feira, 28 de abril de 2020

Agustina, a Grande


Há leituras que são deliciosas, que alimentam o deleite de sonhar o que não se viveu e que nos impõem a esperança de que ainda se venha a viver esse prazer. A Bessa-Luís pertence aos raros escritores desse panteão de génios que nos obriga a sonhar sonhos sem fim, que, por sua vez, nos obriguem a jurar que os iremos viver em vida.

Embarquei numa viagem pelas estações de comboio. Tudo porque li as poucas palavras, do muito apropriadamente chamado As Estações da Vida.


Monet, le train dans la neige

segunda-feira, 30 de março de 2020

K Penderecki



É sempre triste quando o autor de música que nos toca, morre. Krystof Penderecki revelou-se-me através do seu Die Teufel von Loudun, os sons e a atmosfera tetricamente belos que captei no S.Carlos, num texto adaptado de Aldous Huxley. Um compositor da escuridão humana.


Gerhard Richter, grun blau rot

domingo, 8 de março de 2020

A peste negra




A peste negra voltou e chama-se covid-19? A mãe natureza está a gritar "fuck the world"?
Really? Have a drink and calm down.


Neale Howells, 
love lust in bed 
puck the world

terça-feira, 4 de fevereiro de 2020

Endeavour




Enough on dying. Faltam cinco dias para o Endeavour nos confortavelmente depressionar e hipnotizar no seu canto "desejo mas tenho medo" de ser amado.


Chichorro

R Scrutton e o Parsifal



A morte não percebe nada de justiça e lá vai na sua cegueira ceifando a torto e a direito. válidos e inválidos, capazes e incapazes, superiores e inferiores, seres queridos ou indiferentes. Está-se nas tintas para o que os que ainda cá ficam pensam da sua recolha. Tantas vezes, unanimemente extemporânea.
Deixei passar uns dias após ela ter posto ponto final na existência deslumbrante de Roger, para ultrapassar o RIP da praxe. Pronto o Homem foi-se, mas o que nos deixou é substantivo. Morre-se mas a obra fica. Vá lá, vá lá!...
E agora resta-me aguardar pela sua visão do Parsifal, prometida para daqui a três meses. Suspiro por ela. Não para a comparar com a minha, mas para me dar pistas de enriquecimento da minha.


Chagall, song of songs

sexta-feira, 13 de dezembro de 2019

O Património desbaratado



O Estado mal gerido é um buraco negro. As provas multiplicam-se sem esforço.
Mas o que me tem estado(Estado!) atravessado é a desfaçatez com que se colocam serviços do Estado a funcionar em locais que bem podiam ser museus, tal a importância que o seu passado histórico acarreta.
Mas não, podemos dar-nos ao luxo de colocar a procuradoria geral da República no palácio Palmela e assim tapar dos olhos públicos um conjunto urbano de época que poderia ser visitado com interesse museológico. Apenas um de muitos outros exemplos, onde o Estado entrega a fruição diária de um edifício histórico a um serviço que poderia funcionar com maior eficácia num edifício moderno.
É contar e pasmar, com os edifícios do nossos rico património, entregues a serviços públicos, ou menos que isso...

quinta-feira, 7 de novembro de 2019

A poesia e a música




Por vezes umas quantas palavras empurram-me o pensamento para o desejo de as casar com música. Desta vez, estas vieram já acompanhadas e o resultado é superlativo.

Blue is not the colour of my voice
If I would sing in blue
 It would drain the oceans
Demolish the pale blue sky
Green is not the colour of my voice
It would deforestate the surface
 If I would be singing in green
Red is not the colour of my voice
If I would sing in red
It would be rage and bloodshed
Impossible to stop
So I sing what I sing best
Yes I sing what I sing best
Black
The blackest
Until it gets to the other side
And there's no more
No more darkness left
My voice doesn't sing to have a colour
But if I sing without a colour
I would diminish all the light
There's so much blackness in my repertoire
A lot of shadows in my arsenal
So I sing what I sing best
Yes I sing what I sing best
Black
I use up all the black
The blackest
Until it gets to the other side
And there's no more
No more darkness left"

Blixa Bargeld / Teho Teardo

Turner, Snow storm

terça-feira, 15 de outubro de 2019

Amado, Manuel








Portugal pouco ama os seus, e nem na hora da despedida da vida se lembra daquele que foi o pintor da serenidade, dando.nos a percepção do invisível. Pouco amado o Amado que morreu. Ficamos sentados no seu jardim encantado.


segunda-feira, 7 de outubro de 2019

Monty Python - 50 anos



Incontornável. É a palavra que me ocorre para referenciar o humor que este grupo nos trouxe há 50 anos. Que não parecem 50 anos, tal é a força de intemporabilidade que transmitem. E acima de tudo, a influência que exerceram e continuam a exercer nos nossos neurónios e nos daqueles que fazem do humor inteligente a sua forma de ver o mundo.


Keith Haring, Tree of Life

quinta-feira, 12 de setembro de 2019

A Gulbenkian - 50 anos


Sou pouco dado a efemérides, ainda por cima quando elas se banalizam à tripa forra. Mas apercebi-me há dias que o complexo da Fundação Gulbenkian teve a sua inauguração em 1969. Na curva descendente do Estado Novo, o que lhe terá facilitado a vida, como farol de uma modernidade e de uma bandeira contra um regime hermético sob diversos pontos de vista.

Este último aspecto bastaria para uma certa nomenclatura balizar a data. Estranhamente ninguém fala destes 50 anos!

Vivencio a Gulbenkian há muitas décadas, tendo-me apercebido progressivamente da discreta magnificência do complexo. Posso dizer que me fui apaixonando por ele. Nunca conheci espaço mais umbilicado com a natureza, tecendo teias entre uma modernidade e um conservadorismo que não tem rival. Sinto-me tanto em casa como num espaço público, ou seja, existe uma dimensão doméstica que não nos esmaga, antes nos acolhe e conforta, e com esta se intersecta uma dimensão de fruição pública que não incomoda, antes, cativa. Desde a biblioteca ao auditório, desde os espaços museológicos aos jardins, tudo foi pensado de forma a não oprimir, antes, a acolher.

Todo o complexo faz parte, desde há cerca de três anos, da lista indicativa a património mundial da Unesco. Talvez alguém se lembre dos 50 anos para o reconhecimento. Mas pouco importa, quando esse reconhecimento está no coração de tantos.

Turner, naufrágio de cargueiro, Fundaão Gulbenkian 

segunda-feira, 29 de julho de 2019

Tannhauser na colina verde


Um Tannhauser inteligente e desequilibrado, que me fez viajar entre o desespero de uma versão incompleta - tal como W disse pouco antes de morrer "Ainda devo ao mundo o meu Tannhauser"- e a sensibilidade quase colada à genialiduade da música. No saldo ficam as boas ideias de Kratzer, e a frustração de mais uma obra mal lida, malgré tout.

Bayreuth, 2019

Morrer em vida


Sonhar que se morre no sono. Pura cobardia, a de morrer sem sofrimento.
Mas será que a morte tem assim tanto significado? Claro que não, trata-se de apagar uma existência, a daquele que existiu e que não mais vai sentir o que quer que seja. Então porquê a cobardia? Porquê ser nobre morrer com sofrimento?
Expulsemos as religiões, verdadeiros demónios dentro de nós. Elas sim, o capote dos cobardes que não nos querem deixar morrer em vida, de viver a única forma digna de morrer. Ao sol.


Hopper, Woman in the sun , People in the sun

segunda-feira, 8 de julho de 2019

No peito dos desafinados também bate um coração



Percebe-se o exagero de Caetano "Melhor que o João só o silêncio e melhor que o silêncio só o João"
Fica a outra certeza do João Gilberto, a de que todos morremos, mas mais felizes porque ele nos deixou a sua musicalidade embrulhada em sensibilidade de desafinado e para desafinados.

Antony Gormley, escultura

quarta-feira, 19 de junho de 2019

Afinal, o que somos nós individualmente?












 Conseguimos ter-nos de pé, na absoluta fragilidade do esqueleto abandonado pela carne. É isto que somos, mesmo quando pensamos de cócoras.

 
Antony Gromley, diversas estátuas

quarta-feira, 27 de março de 2019

Dos que morrem porque não escapam à lei da morte


Desde o seu nascimento, que sabemos que irão morrer. E morrem, ainda que a sua vida nos tivesse preenchido de alguma forma. Ainda que de tal inexorabilidade nos tivéssemos esquecido.

Têm sido tantos os que abandonaram o mundo dos vivos, tantos os que nos deixaram obras perpétuas, que seria injusto mencionar uns quantos e, por falta de espaço e de organização, olvidar outros.

Talvez um dia venha a escrever o que hoje me apeteceria se o tempo - velho inimigo - me não concede. Digo apenas isto; Scott B já se tinha unido a Jacques B. Esta semana ficaram no mesmo plano.

Almada Negreiros, arlequim, bailarina, cavalo

Nobel sem nobreza



Pois este ano o Nobel da literatura vai ser atribuído duas vezes, recuperando a patética não atribuição do ano passado (meu Deus, Jesus, Credo, os escândalos sexuais que Ninguém sabia que existiam!!!).

Ainda que eu menospreze o Prémio como sinónimo de qualidade garantida, não posso evitar a tentação de pedir um daqueles prémios para o Marias. Se atribuído, por ser um num ano de dois, certamente o outro premiado manteria os nobres holofotes sobre o cobiçado Nobel. E assim a injustiça dos justos se perpetuaria.



Afremov, desolação

terça-feira, 19 de fevereiro de 2019

Retrocesso ou Avanço civilizacional?


Em França erradicam-se os termos Pai e Mãe, dos manuais escolares, substituindo-os por Parent 1 e Parent 2.
Brilhante retrocesso civilizacional que, de forma aparentemente simples, vai imprimir nas mentes em formação, um novo estereotipo dos seus progenitores.
Mas também um brilhante avanço civilizacional, pois resolve a equação de múltiplos Parents, já que sabemos que o ser humano tem recalcada uma certa tendência poligâmica, mas que o futuro, onde vale tudo, nos irá positivamente trazer. Já estou a imaginar os novos crimes de época: Parent 23 assassina Parent 3 por discordar da educação que este queria dar ao filho...
Que maravilha! Que admirável Mundo Novo, nunca sonhado por Huxley!

Posso não querer conhecer este novo mundo?


Keith Haring, A árvore da vida

domingo, 17 de fevereiro de 2019

Regresso a um certo impressionismo






Algum Sorolla veio a Lisboa, algum impressionismo veio a Lisboa, num regresso à cidade luminosa de obras luminosas de um mestre da luz. Brevemente, será Londres a receber uma vasta retrospectiva de Sorolla. Londres bem precisa de luz.

J Sorolla, o magnífico regresso da pesca e a luminosidade de Valencia e Biarritz

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2019

memorabilia - que fazer com ela em vida?


Ao longo da vida acumula-se muita tralha. Grande parte inútil, porque nunca foi revisitada. Outra parte, a estimada por quem a guardou - livros, música, filmes - que fazer com ela? e quando?

Pilhas de livros e milhares de horas em música, que precisariam de uma outra vida para serem revisitados. As solicitações imediatistas ao alcance dos jovens de hoje são de tal forma enebriantes que aqueles activos nada significam. Já para não falar do valor emocional que esta ou aquela obra tiveram para o coleccionador arquivista.

Quem, hoje, olha para aquelas obras como material fundamental para compreender um mundo que se vai esvaziando de valores, de História?
Quem, hoje, os poderá acolher como monumentos vivos?
Quem, hoje, não encolhe os ombros ao coleccionismo, ao acumular de registos históricos?
Quem, hoje, não desdenha estas heranças, quais despojos de um maníaco?

É fácil não fazer nada e deixar o problema aos herdeiros, para quem não passa de lixo.
Mas também há a alternativa romântica: destruí-la em vida, como o último gesto de afeição. Mas, e quando? e por que ordem? de preferência, de registo?

The greatest person of the 20th century


À parte a polémica que estas nomeações sempre trazem, não deixa de ter sido uma personalidade marcante. Ligado à descodificação Enigma, foi sem dúvida o grande pioneiro da inteligência artificial. Castrado quimicamente na Inglaterra puritana e hipócrita, restou-lhe o suicídio. Depois a Rainha amnistiou-o do "crime" de ser homossexual e um Primeiro-ministro pediu desculpa à família.
Então, a referência impõe-se.

quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

Gesamtkunstwerke, é pessoal e intransmissível







Tenho assistido a discussões sobre as múltiplas encenações das obras de Wagner. Como ponto de partida para legitimar toda e qualquer "versão", está a incentivação que o Mestre fez antes de morrer para que quem pegasse nas suas obras fosse criativo.
Mas, ser criativo dentro do conceito de obra de arte total.
E o que se tem verificado ultimamente é a usurpação, pelos pândegos da regietheatre, das obras, travestindo-as com a mediocridade das suas visões. Banalizando a genialidade com as suas provocações. Salvo algumas excepções, ou alguns momentos de inspiração, os resultados têm conseguido desequilibrar o balanço requerido para se assistir a uma "obra de arte total". Total e não parcial, com versões dominadas pela teatralização, ofuscando a música e o texto com os devaneios provocadores de quem quer conquistar notoriedade à custa da genialidade do criador. Ao ponto de se falar do Anel de Fulano, do Parsifal de Sicrano...
Chegados a este desvario, tomo para mim que a melhor produção (depois do minimalismo de Wieland Wagner) é a versão concerto com interpretação teatral dos solistas, a qual permite ao espectador ouvir a música e as palavras e a forma como são ditas, e assim imaginar o contexto da teatralização. Fazendo mentalmente a sua própria produção. Pessoal e intransmissível.



Turner, The parting of Hero and Leander


segunda-feira, 26 de novembro de 2018

Quanto valem os artistas vivos


Este quadro de Hockney foi vendido há dias por 90 milhões de dólares, estabelecendo o valor mais alto pago por uma obra de um artista vivo. Afinal os vivos ainda valem alguma coisa!
Numa perspectiva mais alargada, porque não equacionar as mais ou menos drásticas mudanças de paradigma nas situações até aqui aceites sem polémica... Vivemos numa sociedade capitalista com avanços e recuos no establishment sociológico. E começamos a ouvir - por dentro deste capitalismo - vozes que o colocam em causa. Desde os movimentos ecológicos até às novas formas de organizar os núcleos populacionais, sejam cidades grandes ou terriolas. Desde a indiferença eleitoral até aos recentes movimentos populistas. Desde os crescentes lucros das empresas, até então globalmente aceites, até à defesa de que esses lucros terão de reverter em boa parte para o benefício da sociedade. Vemos uma forma de estar no capitalismo totalmente diferente da que tem existido e sido amplamente aceite.
Aproxima-se uma nova ver de viver, uma transformação do capitalismo tal como o conhecemos até agora. O capitalismo vai ter de ter um banho de socialismo.



Hockney, pool with two figures

quinta-feira, 15 de novembro de 2018

O triunfo da bisbilhotice



No século passado, Guy Debord descreveu a praga que percorre estes tempos de comunicação fácil, chamando-lhe a sociedade do espectáculo.
A primazia do entretenimento fácil, como anestesia do pensamento e congelação da criatividade. A bisbilhotice como única alimentação da vida. A promoção das fake news como justificação para um mundo em que todos estamos bem informados. Um triste espectáculo!
Esta cultura da ocultação da engrenagem dos poderes através da construção de comunidades amorfas, tem sido um sucesso recorrente para qualquer das correntes do poder, que assim fica liberto para o seu livre exercício. E na altura de plebiscitar, reforça-se o espectáculo.
Isto, a propósito das mais actualizadas correntes falantes, as tecnológicas, digitais, e até virtuais (!). No rescaldo da web summit, a alegria tecnológica do espectáculo em palco, não é mais que a cobertura do espectáculo de bastidores, feio, porque revelador da verdadeira natureza humana. A sofreguidão na busca de investidores para uma maioria de projectos que são uma forma de vida dos novos chicos espertos. Com a benção dos espectadores.


Vieira da Silva, Tours d´Armes

quarta-feira, 24 de outubro de 2018

turismo míope




Se Portugal esteve turisticamente na moda, porque não se aproveitou para renovar a oferta, que coloca o país no radar de um turismo poupadinho, de forma radical privilegiando o segmento que atrai o turismo de luxo? Miopismo político e empresarial.

Tal como os inúmeros violinos de Picasso, poderia Portugal ter ofertas para todos os segmentos. Faltaram violinistas com ambição e visão de futuro. Os erros pagam-se. Nomeadamente, quando um país é pobre de recursos alternativos.



Picasso, violon 1913 e 1915
 Bracque. La musicienne 1917

Sempre




A mente é um labirinto onde frequentemente nos perdemos, mas onde obrigatoriamente temos de nos encontrar sob pena de definharmos.
Vem esta constatação a propósito do bombardeamento de notícias que propagandeiam a alarvice, a obscenidade gratuita, o voyeurismo, e se assumem cada vez mais como estandartes de uma nova versão da indústria do entretenimento. As massas gostam, por isso produz-se mais e mais, nem interessa se o que se divulga é verdade, é uma verdade distorcida ou é uma mentira.
Mas somos humanos, caramba! Não podemos deixar que nos atolem a vontade na lama ébria. Atentos às suas mutações que nos pretendem enganar. Vigiemos a nossa mente, olhando de vez em quando para o passado, para ver se os valores que sempre defendemos ainda nos dizem alguma coisa.
Temos de nos erguer desta baixeza e repudiá-la. Enterrá-la no cemitério do esquecimento.

Gosto destas palavras, e aqui as posso aplicar, de Maya Angelou:

Just like moons and like suns,
With the certainty of tides,
Just like hopes springing high,
Still I'll rise.


Marc Chagall, Les portes du cimetière

terça-feira, 2 de outubro de 2018

O Turismo redescoberto



O turismo parece ter sido redescoberto em Portugal. E a ele se tecem loas.
Exageradamente, no mínimo. O turismo não passa de uma nova forma de colonização, obrigando o autóctone a canalizar a sua potencial produtividade para a obtenção de receitas na exploração desse filão, desse novo El Dorado. Ou seja, o residente vai-se tornando progressivamente dependente do turismo.
Tal como aconteceu noutras formas de colonização, o turismo em massa mata a cultura, banalizando a sua  exterioridade e impedindo a percepção da sua interioridade.
Um mal nunca vem só!
Hoje, o turismo povoa as cabeças de governantes e governados, com ilusões de progresso económico, mas que o é apenas - e de forma não generalizada - financeiro. E redutor, na medida em que trava a criatividade que - ela sim - conduz à produção de riqueza sustentável, ao progresso económico e social.

Associei turismo ao nosso Minho, às gentes minhotas, e lembrei-me deste quadro maravilhoso.


Sónia Delauney, Mercado no Minho