Senhor, a noite veio e a alma é vil.
Tanta foi a tormenta e a vontade!
Restam-nos hoje, no silêncio hostil,
O mar universal e a saudade.
Mas a chama que a vida em nós criou,
Se ainda há vida ainda não é finda.
O frio morto em cinzas a ocultou:
A mão do vento pode erguê-la ainda.
Dá o sopro, a aragem - ou desgraça ou ânsia -,
Com que a chama do esforço se remoça,
E outra vez conquistemos a Distância -
Do mar ou outra, mas que seja nossa!
Nem rei nem lei, nem paz nem guerra,
Define com perfil e ser
Este fulgor baço da terra
Que é Portugal a entristecer -
Brilho sem luz e sem arder,
Como o que o fogo-fátuo encerra.
Ninguém sabe que coisa quer.
Ninguém conhece que alma tem.
Nem o que é mal nem o que é bem.
(Que ânsia distante perto chora?)
Tudo é incerto e derradeiro.
Tudo é disperso, nada é inteiro.
Ó Portugal, hoje és nevoeiro...
É a Hora!
(Fernando Pessoa, Mensagem)
A Distância que Portugal precisa conquistar é a que nos afasta da Europa ocidental. É a conquista do tempo perdido, apostando no ensino, no movimento de aculturação dos portugueses. Enquanto não houver vontade dos seus habitantes de se dotarem com a capacidade de identificar problemas, sugerir soluções, rejeitar mediocridades e oportunismos, Portugal será uma nau que navega conduzida pelos ventos da desgraça ou da ânsia. Em perpétuo nevoeiro...
Compete aos possuidores de elevada moralidade, a educação daqueles com quem se cruzam. Até que os políticos possuam essa elevada moralidade e encetem as medidas para separar o trigo do joio, educando os jovens para continuarem essa tarefa prioritária.
Cada Hora que passa é uma Hora perdida.
Almada Negreiros, Fernando Pessoa