Saudade
De um tronco oco
Outrora robusto e prenhe de vida.
A saudade é uma
árvore que sangra
De ramos secos Que arranham o ar.
A saudade é uma árvore
que sangra
De raízes soltasAnsiosas por serem agarradas.
A saudade é uma
árvore que sangra
De folhas
amarelecidasIncapazes de receber o sol.
A saudade é uma
árvore que sangra
Por ter deixado de
ser regadaCom sangue vivo.
A saudade é uma
árvore que sangra
Até que um pássaro
ferido a escolhaPara nela repousar
E que a mistura dos seus sangues
A possa sarar.
A saudade é um
pássaro que sangra
Ferido pelas
distâncias,De asas amachucadas
Por ventos contrários,
Na procura da sua árvore.
Aparece árvore
minha.
Vem passarinho
Ferir-te nos meus
galhosCurar-te nas minhas folhas
Alimentar-te da minha seiva
Matar esta saudade.
Ilusões
Renego as ilusões
Meu arco-íris de
ilusõesAlegres e depois tristes.
Renego as ilusões
Porque formam a
conchaQue encerra esta dor de viver.
Renego as ilusões
Que me fizeram
apaixonarPor esta dor sem alívio.
Renego as ilusões
Feitas de memórias
e esquecimentosQue há muito deixei de explicar.
Renego as ilusões
Por tornarem o
racional incómodoComo uma comichão atormentadora.
Renego as ilusões
Ecoando em mimComo o sino de uma aldeia deserta,
Tocado pelo vento,
Numa monotonia
De roubar a respiração,
Anestesiando a alma,
Afastando a realidade
Para mais e mais longe.
Refém das ilusões,
Meu deus! Como eu
amo a dorÚnica realidade nas minhas noites de vigília
Única realidade nestes dias sem luz.
Vejo a tua face
Abro os olhos e
julgo acordarDe mais uma ilusão,
Mas logo os teus olhos transparentes
Me deixam ver a realidade.
Beijamo-nos na realidade de uma ilusão
Amamo-nos na ilusão de uma realidade.
Deixo de renegar
as ilusões
Abraço este meu
mundoConstruído nas ruínas
Da felicidade efémera
Abraço este meu mundo
Refúgio e protecção
De futuras felicidades efémeras
Abraço este meu
mundo
Onde não quero
ninguém mais......Que não saiba como o destruir...
Ah! Mais uma
ilusão para o arco-íris!?.
Mendigo uma
destruiçãoRezo pelos cantos
Busco uma fénix
Anseio pela destruição do meu corpo!?
Vejo já o meu
corpo-carcaça
Rodeado de ar
putrefactoMexendo-se na sua inércia
Empurrado pelos seus habitantes
Que dele se alimentam.
Vejo já o meu
corpo-carcaça
Transformado no
habitáculo Anónimo e impessoal
De vermes inconscientes da própria existência
Que dele se alimentam.
Vejo já o meu
corpo-carcaça
Não mais lavado
pelo sangueQue um coração sem alma bombeava sem cessar
Num ritual de imensa futilidade
Corrompido pelo tempo que deixou de o alimentar.
Vejo já o meu corpo-carcaça
Espectáculo das minhas emoções,
Afinal ainda vivas mas sem brilho,
Emoções em busca da purificação
Que me alimentará.
Corpo dissolvido
na dor confusa
Deixo de viver
para morrerQuero morrer para viver
Deixo de mendigar farrapos de amor
Quero respirar para além da dor e do amor.
Ah! Se ao menos a
lua trouxesse os seus lobos
E acabasse com o
espectáculo.Vejo o arco-íris das ilusões,
Agarro uma,
Mal me oiço a desejar
Ah! Se tu fosses um lobo
Trazendo-me a redenção num beijo.
FL Wright, Falling water
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