Tristeza
Ela entra por mim adentro
Misturando-se com os meus pensamentos
Insinuando-se nos meus gestos
Dançando com as minhas preocupações
Tornando-se essencial no meu olhar,
Fundamental nas minhas esperanças: ela
É imprescindível nas minhas caminhadas.
Sem se anunciar,
Ela murmura o que
eu souDesalinhando o que eu penso que sou,
Transformando as minhas dores
Embrulhando-as em acre nostalgia,
Traduzindo as minhas alegrias
Em pacíficas introspecções: ela
É imprescindível nas minhas caminhadas.
Sem se anunciar,
Ela chega
disfarçada de viajante,Leva-me até à lareira dos meus pensamentos,
E ao ver-me aninhado a seus pés,
Toca-me ao de leve na cabeça
Protegendo-me da desprotecção do seu bafo
Sublinha o seu estranho e permanente sorriso: ela
É imprescindível nas minhas caminhadas.
Sem se anunciar,
Ela impõe-se na
sua nitidez,Arrasta-me pelas mãos prisioneiras
E obriga-me a atravessar as avenidas da esperança
Sem me deixar parar,
Para saborear as tonalidades dos outros seres,
Tornando-me dependente da urgência turística: ela
É imprescindível nas minhas caminhadas.
Sem se anunciar,
Ela convence-me
que sempre fez parte de mim,E discretamente, no alarido dos meus gestos,
Começa a cantar aos meus ouvidos,
Até que eu, hipnotizado, caminho sem destino,
Mergulhado nas maravilhas da solidão,
Abraçado a ela, a quem chamo a Minha Tristeza: ela
É imprescindível nas minhas caminhadas.
Labirinto
Abatendo-se sobre a esperança,
Depois a percepção do labirinto
Em que a esperança me largou.
Primeiro o
inconformismo,
De me saber
perdido,Depois o repúdio definitivo
Da letargia em que vivo.
Primeiro a
rebeldia
Contra o
entorpecimentoDepois a vigorosa escolha
Da liberdade, preso a ti.
As cores da vida
Impede-me de saborear
As tonalidades da natureza.
A ilusão de julgar
ver
As cores da vidaAfasta-me do prazer
De as distinguir.
Aguardo o momento
de conhecer
As cores da vida,Fundindo-me nesse instante
Com todas e cada uma.
Uma cor e outra
cor, e outra,
As cores da vidaAfinal, desfilam permanentemente
Perante os meus sentidos.
Cada cor
insinua-se em mim, e
As cores da vidaVarrendo a minha cegueira,
Perdoam as minhas ilusões.
Alegria
Breve como um relâmpago
Duradoura como a água
Intensa como uma faísca
Frágil como uma canoa.
As alegrias que já
tive
Deixaram-me mais
rico,Enriquecido por ser pai, amigo, amante.
As alegrias que já
tive
Deixaram-me mais
pobre,Consciente da pobreza de ser pai, amigo, amante.
A alegria
esfuma-se
Deixando-me órfão,
Deixando-me rico,
Deixando-me pobre,
Deixando-me triste.
Para quê viver a
minha alegria,
Se não a puder
partilharCom quem se sinta também
Mais rico e mais pobre?
Mais vale recusar
a alegria:
Mal a pressinta,
há que fugir,Poupando-me à triste ressaca
De saber-me viver anestesiado.
Porém, se o Sol me
tocar,
Se o vento me
beliscar,Se o mar me beijar,
Mesmo que eu não perceba
Que tu te disfarçaste
Para me tocar, beliscar e beijar,
Então, não fugirei da alegria.
Breve como um
relâmpago
Duradoura como a
águaIntensa como uma faísca
Frágil como uma canoa,
De bom grado a acolherei.
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