domingo, 21 de março de 2010

A Primavera


A estação das estações. Tabém este ano a data do seu início me transporta para os mares de bonança. É uma data que encerra uma magia telúrica, como se a força de viver, anualmente renovada, se exprimisse orgasmicamente. Enfim, pelo menos assim a continuo a imaginar, depois de já a ter vivido. Cada um terá as suas listas (ando a ler A Vertigem das Lista, visualmente fabuloso, conceptualmente genial, uma obra de Primavera sem dúvida), e certamente a lista das datas será uma das mais comuns. Pois ponha-se esta data nessa lista e celebre-se. Para mim, ela é a bonança.

Mas esta semana aproxima-se tempestade. Ou talvez não.

Giuseppe Arcimboldo, A Primavera

terça-feira, 9 de março de 2010

Mulhercídio


Ontem foi dia de reavivar uma série de disparates, a propósito da mulher. De ano para ano a tónica cresce sobre o imperativo da igualdade com o homem.

Farto-me de dizer que Malthus foi o primeiro a pôr o dedo na ferida: o crescimento populacional - quase em exponencial - é a fonte de todos os desequilíbrios. Temos provas dia a dia, e só não as vê quem quer ser cego.

O controlo de natalidade na China - um filho por casal e de preferência homem -, começou por ser criticado e hoje é abençoado. Subrepticiamente idênticos controlos foram sendo estabelecidos nas regiões densamente sobrepovoadas. Mas aquilo de que ninguém fala é da destruição do sexo feminino. China, Índia, claro. Mas aumentemos a lupa para ver mais de perto: também sociedades ricas, cristãs, muçulmanas, estão a fazer uma razia no género feminino. Milhões de casais (sim, milhões) planeiam hoje a sua vida familiar. Querem ter apenas um filho, e querem um homem. Para sofrer menos descriminação, porque tradicionalmente um homem tem sempre a primazia, porque quando formos velhos, um filho homem terá mais meios para poder tomar conta de nós, porque um homem não engravida e assim corre menor risco de desgraçar a sua vida, etc. Por tudo isto, milhões de casais que querem apenas um filho (mas não só), preferem que seja um homem. Se for mulher, aborta-se.

Entra também aqui a teoria do 8 e do 80: o que começou por ser um controlo de natalidade, vem a desembocar em sociedades com mais homens que mulheres, e todos sabemos que homens solteiros a mais são o combustível para aumentos sensíveis dos índices de criminalidade. A organização CASS estima que a China em 2020 (é já amanhã) terá mais 30 a 40 milhões de jovens homens com idades abaixo dos 19 anos do que jovens mulheres, por isso sem perspectivas de casamento (pois, há sempre a possibilidade homossexual). Tantos quanto a totalidade da população jovem masculina nos EUA. Oscila-se de problema social em problema social.

Como alterar este desequilíbrio considerado por muito boa gente, uma fatalidade? Educando. Acabando com os estigmas do passado sobre a secundarização da mulher na sociedade, abolindo leis primitivas que impedem uma mulher de herdar, códigos civis que dão ao homem a prioridade social. Promovendo o emprego em todas as categorias de emprego, começando por aquelas que melhor interagem na sociedade (serviços públicos, hospitais, forças de segurança, e por aí fora).

Para um dia, conseguirmos estabelecer o equilíbrio, e devolver à natureza a sua gestão.

Foto de Cartier-Bresson