sexta-feira, 22 de maio de 2009

O futuro não vivido




Às vezes releio o que escrevo. Reli o Comunicar. E tenho de o complementar.

Ao sermos apanhados na espiral da evolução dos tempos, fica a inquietação de não podermos, logicamente, sobreviver ao futuro mais longínquo. A inquietação reforça-se com a consciencialização de que o futuro traz evoluções, muitas com potencial para mudar radicalmente os actuais hábitos de vivência. Um exemplo extremo: pode-se admitir a não adopção da eutanásia com o argumento de a evolução científica poder vir a permitir retrocessos benignos nos estados terminais.
A minha inquietação vai ainda mais longe: quantas das evoluções que se irão confirmar no futuro, estão a ser anunciadas hoje? para daqui a 5, 10, 30 anos? Como é cruel, sabermos que não estaremos vivos para apreciar situações que gostaríamos de viver!

Se tivéssemos hipótese, seríamos Faustos?
(Edifício de N.Foster)

terça-feira, 19 de maio de 2009

Comunicar


Nunca em tão pouco tempo se alterou tanto a forma de comunicar. Longe vão os tempos em que se aguardava, impacientemente ou nem tanto, que o correio nos trouxesse uma publicação impressa. Menos longe, estão os primórdios da rádio e depois da televisão. Foi ontem o boom, com a internet. Foi hoje, a adopção da blogosfera. Foi há instantes, o aparecimento do twitter. E agora? Com tamanha capacidade de comunicar em tempo real, como vamos ter tempo para os compassos de espera? Como vamos poder parar para pensar? Não falo já em descansar. Mas sim, em perspectivar a vida e as conexões que nos afectam como indivíduos. Porque se não conseguirmos isso, não nos libertaremos da espiral que nos consome a existência. E passará a ser "normal" a vida em permanente comunicação, numa ilusão de individualidade, afinal totalmente condicionada pela fome de estarmos actualizados. Sem darmos por isso, estaremos a prescindir da nossa intimidade, da nossa relação connosco próprios, da vontade de nos vermos como indivíduos únicos, e não como portadores de um ADN comum a todos os que não saem daquela espiral de vivências alheias ao nosso íntimo ser. Estamos em plena era da robotização. Tão perfeita que, sublinarmente, acreditamos que cada robot é um indivíduo.
Saudades de pisar um parque, de cheirar a vida, da relativa liberdade daquele cervo? Servo? Sirvo?

sexta-feira, 15 de maio de 2009

Belém e Cia.


A instituição republicana ainda não provou superar a monarquia. Argumentos não lhe faltam, e o mais badalado e demagogo tem a ver com questionar o facto de uma família se inundar de privilégios pagos do bolso dos contribuintes. A propósito das últimas visitas estatais do casal presidencial, em mal escondida ânsia turística, confesso não ver diferença orçamental. Fiquemos pelo grande factor de diferenciação: a perpetuação familiar. E o inevitável perigo de colocar como símbolo do Estado, alguém de quem o Estado se envergonhe, ou venha a envergonhar. Mas, será mesmo um risco superior à garantia de possuir uma instituição imutável, como a bandeira ou o hino? Pois, de Presidentes que nos desapontam, temos todos a nossa conta. De Belém, guardo como maior tesouro a sua custódia, obra-prima recém-restaurada da ourivesaria portuguesa do manuelino, atribuída a Gil Vicente. Seguramente, nenhum presidente!

quarta-feira, 13 de maio de 2009

Igreja de S.Roque






Juro que não é por ser 13 de Maio. Passo muitas vezes pela Igreja de S.Roque. De quando em vez, entro. Bonita entre as bonitas. Alberga uma beleza especial. Talvez seja do tecto acolhedor, da sua madeira pintada, muito lá tão acima de nós. Talvez do seu órgão singelo mas distinto. Cujo som já ouvi e me deliciou. Talvez dos vários altares, uns mais ricos que outros, mas todos a falarem connosco. Talvez seja do conjunto de tudo isso. Hoje, passei por lá e tirei umas fotos para este caderno. Pena, a qualidade não fazer justiça a este Tesouro.

A tentação de não fazer nada

As Rosas. Vermelhas. Isoladas, para que a sua beleza transgrida a fronteira entre a discreção e a ostentação. Para que os olhos se fixem nelas. No seu caule defensivo, orgulhosamente erecto. Nas suas pétalas delicadas, e assim imaginar que o cheiro perfumado nos alcança. Depois, cerrar os olhos, e continuar a seguir a imagem das rosas. Flutuar ao sabor da imaginação. Atravessar as águas da piscina como quem atravessa as águas da Mancha, num pulo que faz parar o tempo. Recuar e avançar no tempo. Preguiçando, à solta, na Terra do Faz de Conta.

Os Cedros. Verdes. Onde os olhos descansam, poisados na beleza estranha das suas folhas. De novo, cerramos os olhos, e tentamos passar o filme do seu crescimento. Ainda tão novos, mas já tão crescidos. De pequenos e frágeis, passaram já a robustas árvores que nos protegem do sol e do vento. Deambular por eles é pensar que o tempo não pára. E que atrás de tempo, tempo virá. É preguiçar, afinal.


A Água. Azul. Contemplar o mar é ter a sensação inconcebível do Infinito. E logo ser tentado a imaginar que Terras estão do outro lado. É ver caravelas onde elas não existem. É imaginar a Ilha do Tesouro e a Atlântida distanciadas por poucas braçadas. É ouvir Sereias a ler os Lusíadas na Ilha dos Amores. É preguiçar.


O Heimat. De todas as cores. Nunca perfeitas. Mas onde temos o nosso recanto físico. Aonde o nosso recanto psíquico, regressa para descansar. Onde descansar é Preguiçar.
Porque os dias estão maiores, o bom tempo está aí, e a tentação de não fazer nada pode conduzir a Preguiçar. Mas a Preguiça tem de ser efémera. Para não se tornar perigosa.