segunda-feira, 5 de maio de 2008

o Tempo, sempre o tempo

Nada como um par de feriados para dar vida à depressão! Esta velha amiga que, ora se esconde ora aparece, tem-me visitado nos últimos dias com uma assiduidade enfeitada por um vincado sorriso trocista. Com aquele ar de quem não parte um prato, lá me vem deixando mensagens fatais.
Diz ela: Já viste quantos dias de lazer em duas semanas? Imaginas o tempo que vais poder tirar para ti? O quanto vais poder ler, ouvir e ver! os teus livros por ler, os teus discos por ouvir e ver. Enfim, montes de livros que já compraste e ainda não leste. A somar às montanhas de livros que te apetecia voltar a ler. Enfim, as pilhas de CDs e DVDs que não param de aumentar e que ainda não ou(viste). Que se juntam às centenas de discos que gostarias de voltar a ouvir e a ver. Faltam-te... mais feriados! Aliás, pensando bem, todos os livros e discos que possuis, são apenas uma parte dos livros e discos que pretendes ainda vir a ter. Parece-me que os feriados não vão chegar. Parece-me até que,... não sei se te diga... Podes nem vir a ter tempo de vida para ler, ouvir e ver tudo o queres. Pior, tudo o que já tens. Que desperdício! não conseguires gozar o que te dá tanto gozo. Lembras-te daquela sondagem aos wagnerianos? 22% já ouviram o Anel no mesmo dia! Eu sei que tu também já ouviste. Foi... há mais de trinta anos. E achas que o poderás voltar a fazer? Ah, pois, o tempo que não para de escorrer por entre a vida. Tanto desperdício de viver... em vida.
Digo eu: Viver em vida é também varrer a ansiedade e a depressão para fora de mim.
E mais não lhe consegui responder. Será que ela tem razão? Posso sempre pensar que sou vítima da sociedade de consumo. Que não consigo fugir às compras compulsivas de livros e discos, e que, no final do dia, consigo sempre seleccionar o que realmente gosto e me toca. E para o que me toca terei sempre tempo.
Diz ela, íntima dos meus pensamentos, dando-me o braço, grudada em mim, ostentando o único sorriso que consigo ver: Que mentiroso tão sem jeito me saíste!

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