quarta-feira, 15 de março de 2017

Depressão




Chorar à chuva tem a vantagem cómica de se verem as lágrimas misturadas com os pingos da mesma chuva. Chorar à chuva pode, assim, dissipar o motivo da choradeira. Mas, e se o motivo for a depressão?
Na depressão, pode nem haver choro, apenas uma imensa vontade de não existir. E houve até quem pintasse para exorcizar as sombras.
Em Londres, cidade consistentemente familiarizada com a Arte, Paula Rego expõe, por estes dias, as suas Depression Series, dez anos depois de as ter pintado enquanto combatia a sua própria depressão.
Estranhamente, ao olhar as telas, não deixa de se sentir uma contradição entre a obra da pintora, fora da depressão versus dentro da depressão.
A obra fora da depressão revela uma personalidade profundamente traumatizada e reprimida. Na sua fase dentro da depressão, pelo contrário, existe a aceitação daquela violentação. Existe um sentido de abandono da raiva, desistência da luta para fazer ver ao mundo como a sociedade é repressiva, especialmente sobre a mulher.
E assim entende-se o verdadeiro significado da depressão: o falhanço interiorizado do combate aos traumas, nunca os conseguindo esquecer, deixar de reviver até. Então, os traços da pintura, durante o período depressivo, atenuaram-se, transmitindo uma suave violência, uma expressão submissa, derrotada, da sua luta perdida. As causas e a cura? Nem a pintora talvez saiba!


Paula Rego, Depression Series, Depressiom, Mermaid.

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