quinta-feira, 22 de junho de 2017

Coração de Prazer - Não, Sim, Talvez... - Linhas das Mãos - O Vinho - O Corpo - O Velho




Coração de prazer

 
Imagino a forma do teu coração
Uma forma que me entra, sonoramente
Pelo ouvido, que colei ao teu peito,
No suave batuque orquestrado pelo teu prazer.

Imagino a dimensão do teu prazer
Uma dimensão que me inunda a partir de dentro, a eito,
Até à pele, colada ao teu corpo fremente
Na suave fusão, orquestrada pelo teu coração.

Sinto então não sei que forma ou dimensão
Meu corpo defeituoso, forrado sem defeito
Pela música do teu coração batente
Meu prazer sem fim, dançando com o teu infinito prazer.

 

 

Não, Sim, Talvez…

 
Não sei as horas
Não é tarde nem é cedo
Não sei que noite é esta
Não me lembro de ter visto o dia
Não me sinto perdido
Não preciso de abraçar a alegria
Não canto nenhuma canção
Não sei as horas
Não tenho medo
Não tenhas medo de viver
Não te escondas dentro de mim.

Sim, o amor é azul
Sim, as estrelas riem comigo
Sim, apetece-me cantar bem alto
Sim, às vezes tenho vergonha
Sim, olho demasiado para o umbigo
Sim, corrigir-me-ei, palavra de amigo
Sim, o azul fica-te bem
Sim, o amor é azul
Sim, o teu corpo também
Sim, quero casar contigo.

Talvez não existam certezas
Mas os teus olhos existem
Talvez eu tenha alucinações
Mas as tuas mãos acariciam-me
Talvez a confusão me tenha invadido
Mas a tua boca é saborosa
Talvez a imaginação ande à solta
Mas só o teu corpo me dá prazer
Talvez não existam certezas
Mas não sei viver sem falar contigo
Talvez tu não existas
Mas o meu amor cresce contigo.

 
 
 

Linhas das mãos

 
Percorro as linhas das minhas mãos
Com os olhos ansiosos por um sinal
Dói-me a vista, cansada de tanto fixar
Linhas onde tu estás e eu não te vejo.

Acaricio uma mão com a outra,
Na procura de um beijo
Nunca amar me fez tanto mal
Ao deixar, por completo, de acreditar
Que eu não existi nunca
Até que me senti nas tuas mãos.

Exausto e faminto, fecho as mãos
Por elas deixo escorregar as linhas
Para, de imediato, formarem um altar
Onde me ajoelho de mãos postas.

Orando não sei a quê, quem ou porquê
Apenas mudo comigo mesmo
Apagando sorrisos moribundos
Enxugando lágrimas não convocadas.

Preces que não conhecia, foram ouvidas
As linhas desmancham o altar improvisado
Desenhando à  minha frente o paraíso:
Começam pelos teus lábios, acabam no teu sorriso.

Voo de mãos abertas
Para agarrar a tua forma
E por magia, as linhas esfumam-se
Deixando o teu cheiro.

Os meus olhos bebem o teu cheiro
O lenitivo que lhes dá descanso
Poisam nas minhas mãos de novo
Encontrando as linhas onde tu estás e eu te sinto.





O Vinho

 
Vinho é néctar escrito com o sangue
Pulsado pela alegria de viver.
Beber e sentir os seus taninos
É expulsar o medo de morrer.

Beijar os teus lábios molhados de vinho
É soltar uma alegria que existe com mágoa
E sonhar com a felicidade de um ninho
Nas hastes de uma videira.

Os teus risos são bagas de uva
Prenhes de sumo que me dás a beber
E que dentro de mim vou fermentar
Para não mais te esquecer.

 


 

O Corpo

 
As saudades do teu corpo
Inundam-me os olhos
Afogando-me os sentidos
Na tempestade dos sentimentos.

Desejo rir sem parar
Nas cócegas do teu corpo
Sentir o teu prazer nadar
Nas cócegas do meu.

Cobiçado pelos arquitectos da estética
O teu corpo é a beleza
Impura, por tornar belas as impurezas
Que só o Grande Arquitecto soube moldar.

Numa ansiedade feliz e orgulhosa
Por o teu corpo me desejar
Mergulho cada vez mais, na tempestade saudosa
Afogando a ansiedade para mais te amar.

 
 

 


O Velho

 
Carcomido pela vida que não consumiu
O velho arrasta a sua existência
Como acessório de um banco de jardim
Por onde agora espreita sem paciência
Outras vidas que já não quer consumir
Mas a que se agarra, sem fome
Parasita frustrado, sem princípio nem fim.

Velho a quem os alimentos contamina
Gasto das lutas contra a ciência
Cansado de rejeitar qualquer vitamina,
Nestes dias de uma única alegria
Aquela que chega com o anoitecer
Carregada da esperança fúnebre
De que amanhã não haja dia.

 


Basquiat, riding with death

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